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3 de mar. de 2012

O palhaço e a Rainha.


Ele foi considerado o melhor palhaço da trupe, tinha um jeito diferente de lidar com a plateia, não precisava de gestos mirabolantes, não precisava de tropeções.

Misturava o humor europeu, com o sotaque nordestino, mudanças de entonação, e pequenos gestos naturais, como a maneira de virar o rosto, ou de caminhar sobre o palco, faziam com que as pessoas prendessem suas atenções sob ele.

Até em dramas conseguia fazer com que as pessoas rissem antes de chorar. Quando parava e olhava para o publico, dava-se para enxergar a sua alma, era como se entrássemos em seu corpo e sentisse suas dores, suas magoas, como se conhecêssemos seus amores, suas amadas.

Fora do palco era tímido e calado, mal conversava com sua família, tinha amigos estranhos, de classes, e de gostos diferentes, nunca se importou com essas diferenças, nunca pensou nessas diferenças.

Ultimamente estava meio distante, mais do que sempre tinha sido. Parecia que ele queria estar distante e que estava gostando disto.

Educado como nobre, mesmo sendo plebeu, assustava os nobres de sangue, com suas opiniões e colocações fortes.

Passeava todos os dias em frente a um castelo de nobres coronéis da região litorânea. Onde montava seu teatrinho e fazia atuações com bonecos. Formava multidões, deixava moças impressionadas com as estórias de príncipes encantados, e de pobres apaixonados.

Também recitava, verso, poesia, musicas, e no final sempre tinha um beijo apaixonado, que fazia os fios dos bonecos se enrolarem como se fossem suas próprias línguas.

*****

Ela era doce, bonita e tinha uma delicadeza simples e singela, de boa educação, vivia em seu  próprio mundo, trancafiada em seu castelo.

Tinha um talento esplendido com desenhos e literatura, sempre gostou de filmes e boa musica.

Era refinada se comparássemos com outras donzelas, e exorbitantemente linda, se também comparássemos com as outras donzelas, tinha cabelos longos de tonalidade escura, "pés pequenos como de uma verdadeira princesa" (algumas senhoras diziam impressionadas quando avistavam seus pés delicados).

Tocava divinamente piano, e quando fazia mudava de endereço, atingia um lugar só dela, onde só a precisão de suas mãos, e o som que saia do piano sabia onde ela estava.


Nunca estranhou seres mitológicos, afinal convivia com um dragão, um feiticeiro, e um belo passarinho com cabeça de gato. 

Gostava de observar as multidões e as peças do teatrinho de bonecos que sempre era armado em frente a sua janela.

 As histórias fazia com que ela sonhasse, e imaginasse sempre que um príncipe ou até mesmo um pobre rapaz, prestasse atenção em suas qualidades, ou apenas em sua pessoa.

Esperava ansiosamente o fim de tarde, quando o dragão dormia. Fazia dele sua escada para descer da janela, e ir ver o sol se por.

Um pouco distante, viu crianças sentadas em um circulo, prestando atenção em um rapaz que possuía uma voz um pouco familiar. Ele contava uma história para as crianças, uma história sobre um casal.

O rapaz dizia que o mocinho era um palhaço, que nos fins de tarde. Entregava de presente pedaços de carne e de chocolate para um dragão, parecido com o dragão da casa do coronel feiticeiro que morava em um castelo também parecido com o castelo do coronel feiticeiro, só que era em um lugar muito, muito distante. Fazendo com que uma donzela descesse de uma janela, para ver o céu mudar de cor.


*****

Foi a primeira vez que ela sentiu um frio na barriga, não só na barriga, mas também em suas mãos. Ela foi aproximando-se do circulo devagarzinho, sem que ele percebesse, sentou-se logo atrás.

A visão periférica do rapaz, não tinha conseguido captar a movimentação radiante da donzela, mas o seu olfato, sentiu algo diferente, como se perto de onde estivesse existisse um campo de flores perfumadas.

Virou-se devagar e avistou a imagem mais linda que seus olhos já haviam visto. Desta vez a menos de um metro de distância.

Conversaram e se conheceram, ambos tímidos e calados, combinaram de se encontrarem novamente, e foi assim por varias dias, varias semanas, e vários meses.

Conversavam sobre livros, políticas, histórias, escritores, filmes, pessoas, musicas. Até que o feiticeiro descobriu. E foram proibidos de se encontrarem, de se aproximarem, de se comunicarem e de se olharem.

Na rua em frente à janela do castelo da donzela, ficou proibido qualquer movimentação artística, ou aglomeração de pessoas.

Anos depois, finalmente se encontraram, mas ela já estava prometida e feliz. Conversaram sobre várias coisas, menos sobre eles, menos sobre o que gostavam, atualizaram seus feitos, suas novidades. Meses depois a donzela virou rainha de uma cidade, muito e muito distante.


E o palhaço, assim continuou. Apenas um palhaço.

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